Há meses, os especialistas em epidemiologia vêm alertando que a política de cortes do governo Donald Trump aos organismos de prevenção contra o HIV em todo o mundo levarão ao aumento de infecções e de mortes. Um novo estudo, porém, conseguiu estimar o impacto que a medida deve ter.
A redução de financiamentos internacionais pode resultar em até 10,75 milhões de novas infecções e 2,9 milhões de mortes até 2030, segundo pesquisa publicada na revista The Lancet HIV, nessa quarta-feira (26/3).
O estudo, realizado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), analisou dados de 26 países e projetou cenários catastróficos caso o apoio financeiro se mantenha reduzido.
A modelagem matemática indicou que, sem mitigação, as consequências seriam devastadoras: até 880 mil novas infecções em crianças e 120 mil mortes infantis nos próximos cinco anos. Populações-chave, como profissionais do sexo e usuários de drogas, sofreriam impactos maiores devido à menor cobertura de prevenção.
EUA saem da OMS
- O presidente Donald Trump anunciou a saída dos EUA da OMS em janeiro, no dia em que tomou posse para o segundo mandato.
- O país era, até então, o maior doador da agência de saúde pública da União das Nações Unidas (ONU).
- Os EUA financiaram 75% dos programas da OMS para HIV e outras doenças sexualmente transmissíveis entre 2024 e 2025.
- Os esforços para combater o HIV, a poliomielite, a malária e a tuberculose já são afetados pela pausa na ajuda externa dos EUA.
Países mais afetados pela medida
Países de baixa e média renda, principalmente na África Subsaariana, seriam os mais afetados. A região, que registrou avanços significativos no tratamento e prevenção do vírus, pode enfrentar retrocessos com a interrupção de serviços essenciais.
De acordo com os pesquisadores, os países mais impactados serão: Albânia, Armênia, Azerbaijão, Bielorrússia, Butão, Camboja, Colômbia, Costa Rica, Costa do Marfim, República Dominicana, Eswatini, Geórgia, Cazaquistão, Quênia, Quirguistão, Malawi, Malásia, Moldávia, Mongólia, Moçambique, África do Sul, Sri Lanka, Tajiquistão, Uganda, Uzbequistão e Zimbábue.
“Interrupções na cadeia de suprimentos e falta de pessoal já são realidade em alguns lugares e têm afetado duramente a prevenção. Este estudo é um lembrete claro de que a cooperação e o financiamento internacionais são essenciais para sustentar os avanços que fizemos na prevenção e no tratamento do HIV, bem como no desenvolvimento de produtos inovadores que salvam vidas”, afirmou Meg Doherty, diretora de programas globais de HIV da OMS, que não participou do estudo.
Como as infecções por HIV aumentariam?
Sem investimentos, a suspensão de tratamentos levaria ao aumento da carga viral de pacientes com HIV já detectado e, consequentemente, da transmissão, além de elevar casos de aids (doença avançada que se instala com a proliferação acelerada do HIV).
Programas de distribuição de tratamento preventivo, como a PrEP, e de distribuição de camisinhas também serão prejudicados.
O estudo aponta que mesmo se todos os recursos atualmente disponíveis forem realocados apenas para manter terapias antirretrovirais, deixando de lado prevenção e testagem, ainda podem ocorrer 1,7 milhão de infecções adicionais.
Impacto desproporcional
Cinco grandes doadores anunciaram cortes de 8% e 70% nos financiamentos a partir deste ano, com os EUA suspendendo aportes imediatamente em janeiro. O dinheiro vindo de Washington correspondia a 15% do orçamento total da OMS e 72% do financiamento de programas contra o HIV.
Outros países com alto volume de doações são a Alemanha, o Reino Unido e o Canadá, que também diminuíram suas doações, além de instituições privadas como a Fundação Bill & Melinda Gates.
A OMS estima que, ainda se os financiamentos fossem retomados imediatamente, 61 mil pessoas inevitavelmente morrerão em consequência da suspensão dos planos de prevenção ao HIV até 2030.
“O financiamento sustentável e estável é a única forma de manter acesso à prevenção, testes e tratamentos”, reforçou Doherty. Enquanto isso, países devem buscar alternativas para proteger populações vulneráveis e evitar um retrocesso histórico no combate à epidemia.
Siga a editoria de Saúde e Ciência no Instagram e no Canal do Whatsapp e fique por dentro de tudo sobre o assunto!